03 abril 2017

Para reflexão sobre vida, morte, existência – Ela escutou a notícia de sua morte, mas estava viva!

Estamos nesta fase com a semana santa se aproximando, hoje trazemos um longo texto para reflexões sobre vida e morte, sobre a existência humana, sobre como nós podemos ser frágeis e ninguém está imune da morte, nem mesmo um Presidente, nem mesmo uma rica escritora...
Este texto para reflexão, envolve um fato que aconteceu em julho de 1967 e o texto foi publicado na Revista Cruzeiro, um mês depois.

Veja também: Caso de Premonição? A trágica morte de Eduardo Campos. 
Neste momento, tinha acabado de acontecer um acidente de avião famoso e histórico, já que entre as vítimas estavam o ex-presidente da República Castelo Branco. A escritora Raquel de Queiroz era sua parente, e o avião tinha acabado de sair da propriedade ela. Com isso, nas primeiras horas depois do acontecido muitos pensaram que ela estaria morta.
Enquanto Raquel ficava sabendo pelo rádio as primeiras noticias do acidente, ela acabava constatando que era dada como morta, escutava declarações, lamentações da sua própria morte, seu passado era relembrado, uma experiência sem dúvida impactante cujo relato podemos conferir no texto.

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Raquel de Queiroz – Quase morta – Revista O CRUZEIRO – Agosto de 1967
Durante algumas horas muitos dos que me querem bem pensaram que eu morri como pensaram muitos que não me querem bem, é claro. Quer dizer que durante meio dia fui morta. E, agora que o estupor das primeiras horas está passando, agora, no remate de males, confesso que a experiência foi de alguma forma confortadora.
Nesta grande desgraça que apanho meus amigos – e, entre esses amigo, Alba, que durante a nossa vida toda fora para mim quase uma irmã -, o fato de aparentemente eu haver morrido com eles me deu uma perspectiva especial para encarar a tragédia. De certa maneira eu me sentia um deles; aquela invenção de um repórter alvoroçado, aquela barriga de noticiário radiofônico que correu mundo no rastro do morto ilustre, durante muitas horas foi verdade; se muita gente me acreditou morta, isso já criava uma realidade, pois que a principal consistência da verdade é a fé que ela suscita.
A Verdade só é mesmo verdade quando se acredita nela – e se cremos numa mentira fazemos com que essa mentira tenha um pouco de existência verdadeira. Assim, o sentimento que tiveram tantos de que eu estava morta de certo modo me matou, pelo menos provisoriamente. E, morta provisória, me senti mais perto e mais entendida em relação aos mortos de verdade. Como que diminuiu a distância entre nós – essa terrível distância que separa mortos e vivos, como uma cortina de vidro opaco, sem deixar passar som nem imagem, cortando qualquer comunicação.
Durante aquelas centenas de minutos eu estive do lado de lá, junto com os outros e tam´bem fui vítima. Escutava os bravos rapazes que lamentavam o meu fim, e contavam coisas do meu passado, e explicavam quem eu era, e faziam referências ao meu cadáver. Experiência que eu não digo que seja estimulante, mas é uma lição severa. A gente aprende como tem pouca importância, e como que naturalidade os vivos aceitam o nosso trespasse. Morreu, morreu, vamos adiante. Era muito boazinha, a família vai sentir imensamente, mas que belo dia de sol está fazendo na cidade, é preciso comprar sabonete “Belas Flores” e criança saída é criança que toma Xarope de Alcatrão. Se u não estivesse tão aturdida pela brutalidade da tragédia, tão aflita pelos amigos que, poucas horas antes , se abrigam sob as nossas telhas, sentavam-se à nossa mesa, teria apreciado devidamente a rara oportunidade. Tal como se deu tudo, contentava-me em esperar impaciente que passassem as descrições do meu cadáver e os trechos do meu necrológico, na agonia de descobrir as notícias dos outros, apurando o ouvido para talvez apanhar uma palavra pequena de esperança, um sinal que talvez um deles escapara: ah como mentiram ao meu respeito, podiam também estar mentido a respeito deles. 

Veja também:  Vidência: A Crônica Esotérica em 1912.

Depois, quando descobriram que a morta do avião não era eu, mas a minha querida Alba, aí deixei de me sentir como vítima e passei a sofrer de um intenso sentimento de culpa. Um repórter gritava: “Não foi Raquel que morreu, Alta Flota morreu em lugar dela!” Não era verdade, ninguém morrera no meu lugar, porque jamais se cogitou de me incluir naquela desgraçada viagem. Pelo contrário, fui violentamente contra essa viagem; não digo que fosse premonição – mas porque em principio sou contra essas venturas aéreas em pequenos aviões amadores. Voar só mesmo em avião de carreira, desses que se cercam de todas as garantias, mantidos, dirigidos, controlados por profissionais. Não há como o profissional para nos dar a impressão de segurança e eficiência. E isso tudo eu dizia a eles quando se discutia a viagem – mas agora me doía a frase do rapaz, como se eu tivesse mesmo mandado a pobrezinha morrer no meu lugar. Agora, chovem as cartas e os telegramas dos amigos e me sinto cada vez mais confusa e perturbada. Como uma ressuscitada- e ao mesmo tempo como quem usurpou o que não ganhara, um lugar entre os queridos mortos daquele dia, uma porção de lágrimas e das expressões de mágoa que eram  para eles. Se eu tivesse corrido o perigo, se tivesse partilhado o susto do terrível impacto, e por acaso escapasse, então sim, poderia me sentir com algum direito. Mas fiquei tranquila em minha casa, a escutar, placidamente o que esperava seriam as noticias de um desembarque  feliz, no fim da jornada dos hóspedes. E de repente me vi arbitrariamente posta no centro da tragédia, eu que estava a salvo e garantida – não sei se vocês entendem -, como se eu estivesse roubando o direito de estar entre eles, de morrer com eles. Corava por isso, sentia-me uma intrusa, e me encolhia ainda mais, enquanto a gritaria do noticiário riscava o céu e entrava pelas casas.
Só muito depois foi que me reconciliei. Afinal, por artes daquele engano, eu partilharia mesmo a morte com eles. Como que voltara ao mundo dos vivos depois de conhecer a morte. Senão a morte direta, mas a morte indireta, nos olhos dos outros, no coração dos outros.
E a esses corações que durante meio dia choraram por mim, aos que escreveram, aos que telegrafaram, aos que tiveram susto e que tiveram pena, peço confusamente perdão. Humildemente agradeço as palavras e os sentimentos. E prometo tentar viver este resto de vida de acordo com o que pensaram e disseram, para que, quando chegar a minha hora de morrer mesmo, vocês possam repetir com justiça.
Ou acharão os amigos que estarei exorbitando, a cobrar o meu tributo de lágrimas das duas vezes, quando só tinha direito a uma vez?
Raquel de Queiroz faleceu em 2003, 36 anos depois do acontecido.
Comentando o acontecido:
Muitas coisas deste fatídico episódio podemos extrair reflexões.
Para começar o próprio acidente, que é um impacto trágico, acidentes de avião abalam até nós que nada temos de proximidade com as pessoas que perderam tragicamente a sua vida. O que dirá quando isto envolve parentes.
Outro ponto marcante, é a culpa que fica quando perdemos parentes, o que poderíamos ter feito para mudar o destino, o acontecido. O fato é que se soubéssemos o que estaria para acontecer poderíamos ter feito algo, mas depois do óbito isso fica apenas como um desejo impossível, que dói, nos corrói por dentro, mas já aconteceu... Não se tem como voltar atrás.
E nem entramos na dificuldade que pode ser ter essas relações bruscamente rompidas. Aquelas palavras que não dizemos, aqueles dias que poderíamos ter feito diferente... Muitas pessoas quando perdem um parente se arrependem das brigas por besteiras, dos dias que deixaram de passar com essa pessoa tão querida.
Podemos refletir sobre a nossa própria existência, todo o tipo de experiência de quase morte, ela disse que não iria, mas passou por ela a decisão, poderia ter embarcado junto. Vai que alguém dissesse é uma viagem, é só essa vez, qual a chance de uma tragédia acontecer. Vamos Raquel? Ela fosse tivesse terminado ali a sua existência.  E desta quase morte, Raquel certamente passou por dias com muitas reflexões, assim como na sua cabeça ficaram ecoando frases, lamentos que escutou pela rádio da sua morte.
Muitas vezes pensamos que somos eternos, mas não somos, um detalhes, um escolha errada e podemos não estar mais aqui. Assim como as pessoas que nos rodeiam, algumas até que ignoramos, não damos seu devido valor, elas não são eternas. Poderão ficar no nosso entorno por mais um ano, 5 ou 10... Mas um dia não estarão mais aqui conosco.
Esperamos que neste momento, quem ler este texto, estiver passando por alguma momento de dificuldade, perda de parente, procure nas suas reflexões se sentir melhor. Embora até a Raquel, em um trecho bem interessante, criticasse que tudo parecia normal. O dia estava lindo, as propagandas no rádio seguissem normalmente. Precisamos continuar vivendo, mantendo aqueles que se foram em um lugar especial no coração, mas temos de alguma maneira seguir em frente.
E quanto morrermos, a vida no planeta continuará, o sol brilhará, os pássaros cantarão. Estarão acontecendo inúmeras coisas no momento que morrermos e continuaram acontecendo inúmeras coisas...
E vamos evaporar deste mundo cedo ou tarde e nem o mundo aqui continuará, cedo ou tarde até o planeta morrerá por completo, o Sol irá se apagar. A própria existência humana só continuará no “plano material” se conseguir no decorrer destes anos, milênios se expandir para outros lugares.
No final de tudo, valeu o que vivemos e viveremos. O que é nosso e ninguém apagará foram os momentos que sentimos, partilhamos, nossos momentos felizes que temos que buscar realizar.
E também, nos resta também torcer para ter uma vida do outro lado, reencarnações, quem sabe fica a esperança de reencontrar aquelas pessoas queridas que já nos deixaram.
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