Realize esse ritual no período do quarto crescente, quando a lua estiver em Câncer ou Escorpião (existem almanaques lunares que indicam o caminho da lua pelos signos no ano em vigor).
Você precisará de um ramo seco de alfazema, um punhado de sal marinho, uma pedra de rio, oito conchas da praia, um punhado de alecrim seco, quatro velas verdes e um cristal de duas pontas.
Trace um círculo com o sal marinho (espalhando-o a ponto de torná-lo uma delgada linha), coloque no centro o cristal e a pedra de rio, e, em torno deles, geometricamente dispostas, as oito conchas e por fim as quatro velas acesas na posição dos pontos cardeais. Salpique ao redor com o alecrim seco e queime incenso de alfazema. Sente-se no chão, dentro do círculo, com o rosto voltado para a vela que indica o Norte.
Respire pausadamente e vá relaxando à medida que seu coração se torna mais audível. Você perceberá, então, que sua respiração se encontra no mesmo ritmo que suas batidas cardíacas.
Quando sentir que seu corpo está bem relaxado, observe o cristal no centro do círculo e repare que dentro dele está refletido um pequeno sol, formado pela chama das quatro velas e que se retrai e expande; aos poucos você percebe que, dentro dele, um delicado fio de prata de enrosca, preguiçoso. Acompanhe seus movimentos, a princípio lentos e tomando velocidade à medida que o observa. Uma energia muito intensa o atrairá para o centro desse pequeno sol. Deixe que seu corpo seja levado, sem esboçar nenhuma reação contrária.
Você descobrirá dentro de um enorme labirinto circular, de que só consegue ver os altos muros cobertos por uma verde camada de musgo.
Estranhamente, você não tem a sensação de estar preso, e, dentro de si, existe uma alegre expectativa. Comece, então, a andar ao longo do labirinto. À medida que avança, uma música suave alcançará seus ouvidos. Essa música tem a predominância de flautas e parece vir seguindo as curvas do vento morno que agita seus cabelos. Uma intensa onda de felicidade invadirá seus coração. Nesse momento, você verá os muros do labirinto transformarem-se em finíssimos fios de prata que, delicadamente, se enroscam por todo o seu corpo. Em pouco tempo você estará toda envolvida, ainda que não experimente a menor sensação de opressão, ao contrário e inusitadamente, sente-se confortável, como se esse fosse seu estado natural.
A música torna-se mais intensa, e seu corpo é então atraído pelo solo. Deite-se e estique-se o mais que puder, dando-se conta de que se transformou numa imensa cobra prateada! Seu corpo traça curvas sinuosas no solo, e o contato com a terra úmida lhe provoca delicados arrepios. Com o passar do tempo, voc6e sentirá vontade de enroscar-se sobre si própria e, depois de fazer isso, sentirá um pequeno formigamento na região do ventre, que se dilatará enquanto intensa onda de calor tomará todo o seu ser. Um pequeno ovo de ouro estará depositado no centro da espiral que você terá traçado com seu corpo.
Pegue-o com a boca e enterre-o num estreito buraco no solo. Aos poucos seus membros estarão soltos, e você terá recuperado sua forma.
Nesse momento abandone a visualização. Levante-se suavemente e desfaça o círculo, dizendo as seguintes palavras:
Desfaço esta roda com a permissão da Mãe,
Apago o fogo, retiro o sal,
Recolho as conchas e as pedras,
Varro o alecrim e desfaço o Mal.
Que assim seja,
E assim se faça!
Nesse ritual estabelecemos contato com nossos medos, com aquilo que não queremos ver ou aceitar. Não foi à toa que a serpente se tornou um animal repelente para o ser humano. Por nos sabermos serpentes, por nos intuirmos fonte de prazer é que nos escondemos em medos, sempre metamorfoseados, a fim de não alcançar nossa serpente de prata. Desde muito pequenos somos persuadidos ao total esquecimento desse aspecto prazeroso que trazemos conosco. Tudo que vivenciamos deve ter sempre um aspecto de sacrifício, e, por mais que desconfiemos de que tal ensinamento deva estar errado, acabamos por sucumbir ao sofrimento e inventamos uma série de pavores que nos acompanham ao longo dos anos.
Uma bruxa sabe que viver é buscar o prazer, vivenciar cada instante em toda a sua plenitude. De nada vale a existência se ela não proporcionar prazer. A natureza é prazerosa; tudo nela parece uma grande risada. Voc6e não será capaz de encontrar um riacho infeliz ou um pássaro problemático, ou um coelho deprimido. Nesse ritual nos deparamos com nossos muros, mas não sofremos, pois sabemos que ao final de tudo encontraremos nossa serpente e só assim conseguiremos gargalhar em coro com nossos semelhantes.
(Marcia Frazão