São numerosos os Evangelhos recenseados pelos historiadores das origens do cristianismo; os de Mateus, Marcos, Lucas e João são os mais conhecidos e em algumas Igrejas, permanecem como os únicos «autorizados» para nos transmitirem os ecos e as interpretações dos acontecimentos e dos ensinamentos que tiveram lugar na Galiléia e na Judéia há cerca de 20 séculos.
As descobertas recentes - em 1945 - da biblioteca de Nag-Hammadi no Alto Egito permitem-nos, hoje, alargar nosso ponto de vista e enriquecer nosso conhecimento sobre alguns aspectos até então «ocultados» ou profanados do cristianismo. Os Evangelhos que esta biblioteca contêm, escritos em língua copta saídica - «copta» vem do árabe qibt, contração do grego Aiguptos: «Egito» -, são atribuídos em sua maioria, a discípulos que conheceram Yeshoua (ou Yehoshua), o rabi galileu, atestado por uns, como sendo o Messias anunciado pelas Escrituras hebraicas, por outros como um profeta ou como um Mestre1. E como Salvador universal.
Assim, ao lado dos Evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João, pode-se meditar atualmente naqueles de Felipe, de Pedro, de Bartolomeu e, mais particularmente, naquele de Tomé (ou Tomas), evangelista da Índia (seu túmulo estaria em Madras). Foi estabelecido que algumas logias ou «palavras nuas» deste Evangelho - e de outros mais tardios - seriam anteriores à redação dos escritos «canônicos» e teriam sido habilmente utilizados pelos redatores destes últimos 2.
Ao lado destes Evangelhos, que são agora melhor conhecidos, há um que não parece ter retido suficientemente a atenção dos especialistas e que ficou praticamente ignorado do grande público. Trata-se do Evangelho de Maria, atribuído a Mariam de Magdala, primeira testemunha da Ressurreição e, por causa disso, considerada pelo apóstolo João3 como sendo, bem antes de Paulo e de sua visão a caminho de Damasco, a fundadora do cristianismo.
Yeshoua de Nazaré não é certamente, segundo os textos atribuídos aos apóstolos, o fundador de nenhum -ismo, nem de nenhuma instituição, mas o «Anunciador», o «Testemunho»; alguns chegarão mesmo a dizer «a Encarnação» do Reino possível do Espírito no coração deste espaço-tempo, a manifestação do Infinito no coração mesmo de nossas finitudes, o dizer do Outro nos dizeres do Sendo...
O Evangelho de Maria é o primeiro tratado do papiro de Berlim4. Este papiro foi adquirido no Cairo por C. Reinhardt e ele é conservado, desde 1896, no departamento de Egiptologia dos Museus Nacionais de Berlim. Ele seria proveniente de Achmin ou de suas cercanias, desde que apareceu inicialmente em um antiquário desta cidade. De acordo com C. Schmidt, teria sido recopiado no início do século V. A descrição papirológica do manuscrito foi feita por W.C. Till, em continuação aos trabalhos de C. Schmidt, em seguida tornado adequado e completado por H.M. Schenke5. ... Continua na META, veículo da Rede da Paz.
Jean-Yves Leloup é sacerdote ortodoxo, Ph.D. em Psicologia, Terapeuta, presidente do Colégio Internacional dos Terapeutas e autor de vários livros.